O Comendador do automobilismo partiu
A revista Auto Club News revela nesta edição um resumo da entrevista que José Ney Lins Rocha, ex-presidente da Federação Goiana de Automobilismo (Faugo) concedeu a nossa revista, em 2010, nos tempos sombrios para do automobilismo goiano
O ex-presidente da Federação Goiana de Automobilismo (Faugo), José Ney Lins Rocha, morreu dia 4 de novembro de 2021, aos 81 anos, em Goiânia. Ele foi um dos responsáveis pela construção e revitalização do Autódromo Internacional de Goiânia Ayrton Senna.
Conhecido como Ney Lins, ocupou o cargo de presidente da Federação de Automobilismo por 29 anos . Ele deixa a esposa Maria Teresinha Baptista Lins Rocha e os filhos Gustavo, Daniel e Ana Thereza e um legado na história do esporte a motor no Estado de Goiás.
O velório e o enterro do ex-dirigente foram realizados no cemitério Jardim das Palmeiras, em Goiânia, onde ele recebeu as últimas homenagens de parentes, familiares e autoridades do setor automotivo.
Essa matéria foi publicada em 2010, na revista impressa Auto Club News e reproduzida agora de forma virtual.
CEARENSE SIM SENHOR
Ney Lins era o sexto filho de uma plêiade de 11, nascido na cidade cearense de Jardim, na Chapada do Cariri. Seu pai, diretor dos Correios, faleceu aos 52 anos. Ele então com 16 anos, decidiu seguir a vida, e sozinho mudou-se para o Rio de Janeiro. Sonhava em ser Comissário de Bordo da Viação Cruzeiro do Sul, onde conheceu o compositor Marcos Vale, filho do proprietário da Companhia. Mas não deu certo. Prestou concurso para a Petrobrás e foi trabalhar pelo Brasil afora, desbravando os sertões, levando picadas de mosquitos, dentro do mato, até se cansar dessa vida. Mudou-se para São Paulo onde residiam seus tios e primos que o ajudaram a ser representante comercial, em 1965. De lá migrou para Goiás trazendo as marcas Colgate, Palmolive, Cashemir Bouquet, Pom-Pom e Alert. Atuava em Goiás, Distrito Federal e Minas Gerais. Ficou até 1969 neste ramo, quando abriu a Perfumaria Lins, em frente ao então Cine Casablanca, na rua 8, em Goiânia.
Quando morou em São Paulo, juntava os amigos e visitava o Autódromo de Interlagos, matando a curiosidade, no auge da sua adolescência. Posteriormente quis conhecer o kart, dei algumas voltas de bólido, mas não gostou. “Morri de medo”, confessou.
Foi em São Paulo que Ney Lins se tornou representante comercial e em 1965 veio para Goiás,trazendo as marcas Colgate, Palmolive, Cashemir Bouquet, Pom-Pom e Alert. Atuava em Goiás, Distrito Federal e Minas Gerais. Fiquei até 1969 neste ramo, quando abri a Perfumaria Lins, em frente ao então Cine Casablanca, na rua 8, em Goiânia.
Já em Goiânia, Ney fez amigos da velocidade, no então Automóvel Clube desta Capital. Aí conheceu os pilotos Dézinho Motta, Valeriano, Reginaldo Bufáiçal, Marcos Veiga, Luiz Fernando Rocha Lima, o Nando, Jaime Câmara Jr. e juntos, articulavam reuniões no então Posto Alencastro Veiga, que funcionava na Av. Tocantins com a rua 3, no centro. Ali eram planejados rachas que aconteciam na BR-060 (Goiânia-Anápolis), na saída para Guapó, na praça Tamandaré e em outros locais. Com o movimento crescendo, o grupo resolveu organizar competições para serem disputadas em circuitos de ruas em Goiânia, por ocasião do aniversário da cidade em 24 de outubro.
AUTOMÓVEL CLUBE DE GOIÂNIA
O Automóvel Clube de Goiânia deu origem a Federação de Automobilismo de Goiás, clube que foi fundado em setembro de 1968, trazendo como seu primeiro presidente o coronel Nicola Limomgi, a sede da entidade era na sua casa. Ney conta que tinha 28 anos nessa época e o então governador Leonino Caiado disponibilizou uma sala no Estádio Olímpico (Av. Paranaíba) para que instalássemos a Federação de Automobilismo de Goiás (Faugo). O Nando já assumiria a sua primeira presidência da Federação de 1972 a 1976. E foi o que aconteceu.
O Nando tinha grande habilidade com os regulamentos e foi um dos maiores incentivadores do automobilismo no Estado de Goiás e comissário da CBA. Graças a ele que temos hoje o Autódromo de Goiânia. Ele tinha amizade preciosa e parentesco com a família do ex-governador Leonino Caiado, que autorizou o projeto.
NEY LINS NO MOTOCICLISMO
Ney Lins foi diretor das provas de motociclismo realizadas nas ruas de Goiânia, entre 1971 e 1972. Em 1971, o impetuoso piloto Luiz Limongi, ganhou a competição, mas não levou o prêmio porque ao terminar a corrida ele voltou e atirou o seu par de luvas nos organizadores. Foi desclassificado.
Em 1972, Ney ajudou a realizar o Campeonato Brasileiro de Motos, na rua Nero Macedo, ao lado do DETRAN. Naquela época, quem fazia motociclismo em Goiás era o Faugo. O circuito de rua era fantástico, subia a Av. Tocantins, contornava a Praça Cívica, descia a Av. Araguaia, pegava a Av. Anhanguera à esquerda, seguia nela até o Cine Goiânia, contornava por fora até a Rua 3 e novamente subia a Av. Tocantins. Os boxes eram no meio da Praça Cívica. Participaram dessa prova: Piero Gancia, Emerson Fittipaldi, Wilson Fittipaldi pai e filho, dentre outros.
KART NA PRAÇA CÍVICA
Ney Lins conta que foram realizadas várias provas de Kart, na Praça Cívica foi quando apareceu Nelson Piquet. Ele era tenista, muito bom, largou o tênis e foi para o automobilismo. Ele se juntou ao Zeca Giaffone, ao Alex Ribeiro e fundaram a Camber, empresa especializada em preparação de carros, em Brasília, de onde “inventaram¨ o patinho-feio para disputar as corridas.
NOVAS ELEIÇÕES NA FAUGO
As federações estaduais de automobilismo são formadas através da união dos clubes de marcas. Aqui em Goiás funciona do mesmo jeito. São necessários no mínimo três clubes para se fundar uma Federação. A Faugo tem oito clubes filiados nas categorias de rally, arrancada, manobras, jeep, kart, velocidade, on-road e off-road. Eles se reúnem uma vez por ano para aprovar as contas da entidade, discutir orçamento e reivindicar benefícios para a categoria. Os clubes realizam uma Assembleia, apresentam chapas e elegem a diretoria. Ney Lins lembra que os goianos sempre foram atuantes no automobilismo nacional. “Quando Reginaldo Bufáiçal assumiu a CBA, a sede da entidade estava penhorada, quando ele saiu deixou US$ 1.630.000 em caixa”, comentou Ney Lins com a nossa reportagem.
PRESIDENTE POR 7 MANDATOS
O mandato da Diretoria da Faugo é de quatro anos. Ney foi eleito em 1992 e reeleito em 1996. No ano de 2000 procurou alguém para substituí-lo, mas não apareceu ninguém, muito pelo contrário, houve um abaixo-assinado dos pilotos pedindo a sua permanência, fato que se repetiu também em 2004, quando, novamente permaneceu no cargo, ninguém quis assumir de novo. O presidente foi reeleito em 2010, 2014, 2018. Seu mandato terminaria em 2022.
“Por duas vezes eu quis deixar a Federação,
mas os pilotos fizeram abaixo-assinado para que eu ficasse.”
GOIANOS NA CBA
O Nando também postulou a Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA), mas não foi eleito. Depois dele Reginaldo Bufaiçal, conseguiu se eleger e ficar no posto por 11 anos. Depois do Reginaldo foi indicado outro goiano, o Paulo Scaglione para a presidência da CBA, onde ele atuou por oito anos e em 2010, o indicado foi o Cleiton Pinteiro para mais quatro anos de mandato. Vale ressaltar que o Reginaldo foi o maior presidente da CBA de todos os tempos. Quando ele assumiu em 1990 até a sede da Confederação na Rua Glória, no Rio de Janeiro, estava penhorada. Ao deixar o cargo em 2001, a entidade tinha no caixa 1 milhão e 630 mil dólares.
RECEITAS DA FAUGO
As receitas da Faugo são oriundas das anuidades pagas pelos clubes e pelos pilotos credenciados a entidade. A CBA e a Faugo também recebem uma taxa pela realização dos eventos, por conta da supervisão de cada categoria; cada uma tem um preço diferenciado.
Olhinho com foto
Em 1994, o então governador Íris Rezende, ao centro, no Autódromo de Goiânia, em audiência com a turma da velocidade, Reginaldo Bufáiçal (presidente da CBA), Ney Lins (presidente da Faugo) e à esquerda o vice-governador Maguito Vilela
A ERA DOS RALLYS
O “Rally do Baton” goiano foi um dos maiores eventos já realizado em Goiás. O nome já havia sido registrado pelo estado da Bahia e não pôde ser mais realizado por aqui, com essa denominação. Mas o de 2009 aconteceu com a participação maciça de 423 mulheres, uma festa grandiosa de confraternização do automobilismo. Acompanharam essa nova era o Rally Universitário, o Rally da Acieg, havia uma grande interação e interesse pelo off-road. Todos esses eventos colaboram com uma taxa de adminstração para a Faugo
Olhinho com Foto
Reunião da diretoria da Faugo em 1975 aparece Marcos Veiga Jardim, Mas (em pé), Fernando Campos sentado à direita, Felipe Herrero e Marcos Tadeu Câmara, ambos de costas e Major Colemar, então Superintendente do Autódromo: com poucas condições, essa turma fazia a festa acontecer em harmonia com o Estado.
SOBRE CALMON JR.
O Trail Club de Goiás, fundado em 1989 pelo Calmon Jr. é uma das entidades esportivas mais respeitadas do Estado de Goiás, segundo Ney Lins. Naquele ano (2010) ele já era o melhor, um expert no rally de regularidades, tinha apoio dos grupos Tecar, Govesa e Cotril. Grandes eventos foram realizados por ele, que se tornou comissário da CBA na modalidade. “Ele sempre nos acompanhou como integrante da nossa diretoria à frente da Faugo”, lembra Ney Lins.
Na época, a moda dos rallys virou febre, e surgiu também o Rally dos Sertões, sob o comando de Marcos Ermílio de Moraes.
O governador Alcides Rodrigues, Ney Lins, o tricampeão Emerson Fittipaldi e o vice-governador Ademir Menezes em vistoria ao autódromo de Goiânia
KM DE ARRANCADA
Em sua entrevista, Ney Lins já elogiava e incentivava o pessoal que promoveu o Km de Arrancada. “Esse pessoal é muito competente, realizam um evento emocionante , com toda segurança, reúnem público, trazem alegria aos amantes de velocidade”, comemorou.
COPA MASERATI EM GOIÂNIA
Um dos episódios mais marcantes da carreira de Ney Lins foi a realização da Copa Maserati, em Goiânia, prova internacional de grande prestígio. Ele comentou: “quando eu trouxe a prova da Maserati para Goiânia fui obrigado a desembolsar R$ 63 mil reais para pagar as despesas do evento prova que tive que cancelar no sábado, com apoio do Diretor de Prova da CBA, devido as péssimas condições da pista para aqueles carros construídos a base de fibra de carbono. Eram carros avaliados em R$ 1,8 milhão e que poderiam ser danificados devido às condições da pista, asfalto esfarelando, colocando em risco, toda a competição. O promotor do evento, em São Paulo, era sócio da Jean Todt (ex-diretor técnico da Ferrari), perguntou se eu estava louco em cancelar a prova. Eu disse, se alguém comprou ingresso, a Federação vai devolver. No domingo, apareceu um monte de ingressos falsificados. Todos que compraram os ingressos foram ressarcidos. Ninguém quis saber do prejuízo que eu tive. Recebi R$ 15 mil de patrocínio da Neo Química, através do ex-piloto Alencar Jr. porque ele ia correr e fazer uma apresentação. E o que fiz? Devolvi o dinheiro do patrocínio.
JOGO RÁPIDO COM O PRESIDENTE
AMOR: Vida
PAIXÃO: Momento
CARRO: Land Rover
MOTO:Aventura
LUGAR: Minha casa
FÉRIAS: Praia
COMIDA: Peixe
BEBIDA: Vinho
PERFUME: Não usa, mas presenteia
a esposa com o “Paris”
MULHER: Tudo, início da vida
CONSELHEIRO: Amigo
MANIA: A fidelidade
ESPERANÇA: Um mundo melhor
CIDADE: Goiânia
PAÍS: Brasil
O reconhecimento do Estado
Em 22 de março de 2006, José Ney Lins Rocha foi condecorado com a Ordem do Mérito Anhanguera pelo governador Marconi Perillo, em solenidade realizada no CEL da OAB/GO. Na foto, ao centro, o “comendador” aparece com seu clã, da esquerda para direita, Daniel Lins, arquiteto (filho), André Luiz, engenheiro e então presidente da Celg (filho), Domingos Batista, juiz aposentado (sogro), a esposa Terezinha Lins (diretora do Externato São José), Ana Thereza Lins, advogada (filha), Ana Clara no colo (neta) e Gustavo Lins Rocha, engenheiro (filho). O ex-governador Marconi Perillo esteve presente ao sepultamento do amigo. (Foto: divulgação)